Demorou, mas consegui um tempo pra organizar as questões sobre os Correios que a gente levantou aqui. Conforme contamos, a super Ana Paula Gameiro, leitora do blog, se ofereceu para tirar as dúvidas e dar as orientações básicas para os casos complicados onde não se consegue resolver os “causos” com os correios na amizade, e é necessário procurar o Poder Judiciário pra intervir e resolver a disputa.
Esse post terá tag "fixo", porque ficará por aqui sempre que precisarmos consultar, e esperamos que seja útil, ao mesmo tempo que esperamos que ninguém sofra danos por parte dos Correios e que precise desses conhecimentos. ;)
Pra começar, algumas considerações da Ana Paula sobre os casos em que se faz necessário apelar para o Juiz:
1- Quem pode entrar com a ação?
No que tange os correios, essa questão é complexa mas tem saida sim pros destinatários!
Em regra, quem sofreu o prejuízo pode entrar com a ação.
Porém os correios alegam que por causa da UPU (Universal Postal Union) que teria regulamentado a questão internacionalmente, o legitimado a propor a ação seria o remetente. Todavia não podemos tomar essa alegação como um dogma que impediria a propositura de ações pelos destinatário, e por quê?
Porque na verdade (e esse é o cerne da tese jurídica) quem está contratando verdadeiramente o serviço é o destinatário. ele que suporta o preço do frete, ele q em alguns casos inclusive escolhe a modalidade em que o objeto será postado e por fim, ele é o destinatário final do serviço nos termos da lei. ( lei mesmo, art. 2º da lei 8.078-90, o código de defesa do consumidor).
Desta forma, nesse tipo de relação, a de comércio via web e principalmente quando o vendedor mora fora do brasil, o vendedor-remetende atua junto aos correios como mero preposto do consumidor-destinatário, que é quem realmente contrata os serviços.
2- Por demora ou atraso, o que se pode fazer?
No caso de indenizaçao por demora é um pouco mais complicado quando se trata de encomendas internacionais porque há fatores que fogem das atrbuições dos correios. ex: qdo se fala em cosméticos, 1º tem q haver liberação da Anvisa e depois da Receita Federal, isso pode também causar atraso e não se deve aos correios. Como não temos como provar que a culpa é dos correios não creio que seja possível.
Todavia, qdo se trata de encomendas tipo sedex, se houver atraso será sim possivel já nos serviços já está estimado um prazo máximo para recebimento.
3- Precisa pagar? Onde se faz?
Não precisa pagar!! Essa é a melhor parte!! Como geralmente são ações de pequeno valor podemos recorrer ao Juizado Especial Federal.
E quando eu digo não pagar é NAO PAGAR NADA!! Nem custas, honorários, nada! Nem se perder a ação!!
Atenção: não é o Juizado Especial Cível comum que conhecemos porque a competência é necessariamente da Justiça Federal !! Isso porque os correios são uma empresa pública federal. (também não tem jeito, tá na constituição federal, art. 109...)
4 - Mas como fazemos pra propor a ação?
Primeiro você tem que ir até a seção judiciária da sua região e saber onde é o Juizado Especial Federal. Aqui no Rio de Janeiro, por exemplo, nós temos vários juizados federais, assim quando fazemos a petição não colocamos o número específico de cada juizado, que será "sorteado" na livre distribuição do processo.
Em algumas cidades do interior os juízes cíveis acumulam a função. Dessa forma não tem jeito, tem que perguntar no forum da sua cidade se é lá mesmo ou onde é na sua cidade o JEF.
Em alguns JEF existe um tipo de formulário que você preenche e narra os fatos do ocorrido. Depois um funcionário te ajuda a fazer os pedidos da peça inicial, distribui e você já sai com o dia da audiência marcado. (Isso se vc preferir fazer tudo sozinha, sem advogado).
Em outros você faz tudo sozinha, mas também geralmente tem um funcionário do cartório do JEF que acaba dando um auxílio.
O importante é contar os fatos de forma clara e de preferência em ordem cronológica. Exemplo: dia tal eu comprei, dia tal eu paguei, dia tal foi postado, etc., pra facilitar o entendimento do juiz.
Tenha sempre a maior parte de provas do que você falou, por isso é importante imprimir ou salvar todos os atos da compra e as faturas do cartão, pra que você possa mostrar ao juiz exatamente o que aconteceu.
É importante ter o endereço com CEP dos Correios, mas isso eu dou pra vocês:
Empresa Brasileira de Correios e Telegrafos ETC
CNPJ: 34.028.316/0001-03
Endereço: SBN , quadra 1 conjunto 3, bloco A, Edificio Sede dos Correios
CEP: 70002-900
Brasilia-DF
Nos pedidos é importante fazer assim e nessa ordem (não tá enfeitado como na vida real, mas é assim que tem que ser):
1) a citação da empresa ré para respoder a presente demanda, sob pena dos efeitos da revelia;
2) a inversão do ônus da prova, tendo em vista a verossimilhança das alegações e a hipossuficiência do autor;
3) a condenação da ré ao pagamento de danos materiais no valor de R$ ..... (o quanto você realmente gastou, o valor dos produtos + o valor do frete)
4) a condenação da ré ao pagamento de danos morais no montante que V. Exa. julgar necessário.
5- E o PROCON?
O procon é um orgão administrativo, não pode impor sanções e condenar à reparação de danos como o judiciário, todavia pode ser que a pessoa consiga chegar a um acordo com a ECT e solucionar o seu problema. Particularmente eu nunca vi, acho perda de tempo, mas sou advogada, ou seja, só chegam nas minhas mãos os problemas e nunca as soluções. Seria leviano descartar sem ter idéia da efetividade do serviço.
E as respostas da Ana Paula às nossas dúvidas, deixadas nos comentários daquele post:
P: Sobre o nosso código de defesa do consumidor: você sabe se ele é baseado em algum acordo ou norma internacional, ou se é apenas a "UPU" (eu nem conhecia!) que regula esse tipo de serviço? (Renata)
R: O entendimento é que embora haja esse acordo internacional entre os correios, isso não pode afastar a incidência do Código de Defesa do Consumidor às questões relativas a prestação de serviço, afinal seria como que uma cláusula que prejudicaria o consumidor e isso, nos termos do próprio CDC é causa de nulidade de tal cláusula. Ora, não é justo que eles façam acordo entre eles buscando se eximir da obrigação de prestar um serviço adequado.
Justamente por isso o entendimento é de que o CDC deve prevalecer sobre outros diplomas legais, haja vista sua caracteristica básica de direito fundamental do indivíduo.
P: Gostaria de saber se caso o pacote tenha sido violado, como a pessoa prova o que tinha nele sem ter nota fiscal? (Erica)
R: Caso venha algo faltando no envelope violado você pode usar o pedido feito pela internet como meio de prova também, isso porque o correto é que a nota fiscal acompanhe os produtos durante o frete, não deve ser emitida e enviada em separado.
P: Comprei um kit da benefit com uma menina que mora numa cidade vizinha a minha, ela mandou por PAC com seguro dia 12 de julho, deveria ter chegado 3 dias úteis depois e nada... alguns dias após o prazo a vendedora abriu a reclmação pra apurar o que havia acontecido com o pacote, mais um prazo de 5 dias úteis que não foi cumprido pelos correios (expirou dia 27) ligamos diariamente no atendimento e eles dizem que ainda estão apurando o que houve e que não há prazo pra que haja um retorno, só dizem que é o mais rápido possível. Queria saber o que podemos fazer pra que eles reembolsem o valor do seguro sem protelar a solução pelo tempo que convém a eles, parece que querem nos vencer pelo cansaço! Qual o procedimento junto aos correios, ou o que devemos fazer (Procon/Justiça) pra reaver o valor?
Agradeço muitooo a boa vontade de vcs e da Ana Paula em ajudar! (Ana Flávia)
R: Ana, sua relação com a vendedora não é necessariamente uma relação de consumo, mas uma compra e venda civil comum, assim eu recomendaria que você tentasse realmente junto a ela o ressarcimento do valor que você pagou e ela sim, junto aos Correios, a devolução dos prejuízos (frete + valor dos produtos).
P: Tenho enfrentado alguns problemas com os Correios nas minhas compras internacionais. Fiz uma compra no ebay, que foi enviada por First Class Shipping, ou seja, sem número de rastreamento. No entanto, este tipo de postagem, apesar dos Correios dizerem que não tem rastreamento, é possível pesquisar o destino do item quando ele chega no Brasil. Pois bem, verifiquei no site do Correios e apareceu a mensagem" saiu para entrega", e logo a seguir outra, dizendo para que eu entrasse em contato com eles. Quando liguei, o atendente disse que constava na tela dele que o pacote havia sido "roubado". Meu orientou a formalizar um pedido de informações, e assim o fiz. Depois de alguns dias, me informaram por e-mail que eles consideram que o dono do ítem é o remetente, e só iriam dar informações a ele.Protestei, pois se eles tem por norma não darem informações ao destinatário, então por qual motivo me fizeram obter um monte de dados do remetente para fazer o pedido de informação? Depois de alguns dias, novo email, informando-me que seguem normas da UPU, órgão da ONU que regula os principais aspectos das relações entre as empresas de correios do mundo. E que o rementente é que teria que formalizar denúncia com a administração postal de origem, uma vez que de acordo com normas internacionais postais, a retratação financeira, pelo serviço não prestado, deve ser feita ao remetente.
Achei que esta é uma forma que eles conseguiram de se safar, pois o rementente não tem nenhum interesse em reclamar, pois ele já recebeu pela venda do produto, e não pagou pelo frete, já que este é custeado pelo rementente.
É claro que o vendedor nem se deu ao trabalho de fazer esta reclamação no serviço postal dos EUA. A sorte é eu abri um caso no ebay, relatei que o vendedor não havia me respondido, e o ebay me ressarciu o valor do produto e o frete.Escrevi para o jornal O Globo, relatando tudo , mas não foi publicado nem na seçao cartas dos leitores nem na Defesa do Consumidor. Uma outra ocasião, o meu produto foi devolvido ao rementente, pois os Correios alegaram que o endereço estava incompleto. O vendedor, o qual eu costumo comprar e sempre coloca o endereço correto, disse que escreveu o endereço direitinho. Os Correios se recusaram a informar qual parte do meu endereço estava faltando, alegando o mesmo motivo que eu descrevi acima. O vendedor me devolveu o dinheiro, mas até semana passada não tinha recebido o produto de volta. E assim eles conseguem não ser responsabilizados por nada. Acho que acões judiciais seriam um meio eficaz de responsabiliza-los, mas se eles se utilizam do argumento que o contrato de serviço de entrega do bem foi feito pelo remetente e só ele pode reclamar, fica difícil a gente poder figurar no polo ativo de um possível processo judicial contra os Correios. (Simone)
R: O seu é o caso clássico. A alegação dos correios que não irão tomar providências junto ao destinatário mas somente junto ao remetente. Como eu já expliquei à Renata, embora haja regulamentação entre os correios mundiais, ela não pode afastar a incidência do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Pense comigo, seria razoável duas pessoas contratarem qualquer coisa e excluírem o direito de uma pessoa estranha ao contrato? Claro que não. A regulamentação internacional NÃO é superior ao Código de Devesa do Consumidor, que inclusive tem status constitucional e não pode ser afastado.
Como se não bastasse, entendo ainda que o remetente atua como mero preposto do consumidor final, que é o destinatário (que inclusive é quem arca com o frete) dessa forma não fica vedada a legitimidade ativa do consumidor.
P: Eu queria saber se apenas o remetente tem o direito de reclamar com relação ao paradeiro da encomenda; e se é certo eles usarem de 5 a 7 dias úteis de tempo para responder sobre a encomenda. (Dáfni)
R: Idem à resposta acima. Quanto ao prazo de sete dias, ele não pode ser considerado abusivo, assim infelizmente temos sim que esperar esses dias, tá?
P: Achei interessante o que vc colocou. Se é verdade que o único que pode fazer alguma coisa é o remetente, realmente eles se esquivam de QUALQUER responsabilidade. O pacote pode ser roubado, perdido, whatever, que o destinatário não pode fazer nada. E CLARO que nenhuma loja vai se dar ao trabalho de correr atrás disso. O engraçado é que o serviço do país do remetente fez a sua parte direitinho... A coisa foi pro brejo quando chegou aqui, né? Então fico imaginando POR QUE diachos a reclamação deveria ser feita junto ao órgão do país de origem. Essa história tá muito esquisita mesmo. (Milena)
R: Na verdade tem uma lógica ser no país de origem qdo a relação não é de consumo internacional. A idéia é que qdo você, por um ato de liberalidade, manda a alguém um presente, carta, encomenda, etc, é realmente o remetente que está contratando os serviços de entrega dos correios. Porém os Correios ampliaram essa ideia pra todas as encomendas e isso não reflete a realidade dos fatos. Nas relações de consumo quem realmente está contrtando os serviços é o destinatário e não o remetente.
No fundo é uma "malandragem" dos correios que buscam se eximir da responsabilidade distorcendo uma norma que em essência é boa, mas não aplicável a todas as entregas.
P: Eu comprei no site cherryculture.com em março (!) e rastreei pelo usps.com e diz que no dia 03 de março o pacote foi enviado ao Brasil. Paguei pelo USPS 1st Class Intl Mail e até hoje nada. Não sei a quem recorrer e o que fazer, pois não tem número de rastreio, mas posso provar que a encomenda foi mandada ao Brasil, né? Ainda tenho esperança, haha! (Júlia)
R: O problema é realmente esse, a prova. O que eu recomendo é que se salve no computador ou se imprima tudo o que diz respeito à compra - entrega do bem. Mas eu digo tudo mesmo, até boleta do cartão de crédito. Quanto mais documentada for a narrativa dos fatos, maior é a chance de se convencer o juiz ;)
P: Se envio uma encomenda por SEDEX, com seguro, em caso de extravio, o frete (bem alto, por sinal!) também deve ser ressarcido? (Gaspinha)
R: Sim, tanto o valor do frete quanto o valor da mercadoria. Tudo o que a pessoa realmente perdeu chama-se de dano material, a dor psicológica é que é o dano moral.
Pra encerrar, reproduzo as palavras que a Ana Paula me passou por email, depois das duzentas vezes que eu agradeci a ela por toda a paciência, boa vontade e generosidade, em nome do Makeupalooza e dos leitores que com toda certeza aproveitarão os conhecimentos da nossa consultora legal (oi, Ana Paula rs):
Percebi que realmente a maior dúvida é se o destinatário poderia propor a ação. Eu acredito que se a pessoa colocar na peça inicial dela a fundamentação que eu coloquei acima, ou seja, demonstrar que o remetente atuou como verdadeiro preposto, vai sim poder ser conhecida a ação.
Todavia quado o problema da entrega for contra empresas brasileiras eu acho mais fácil simplesmente entrar contra a empresa mesmo. Você vai pro juizado especial civel mesmo, e não precisa mostrar sua legitimidade. Enfim, é mais fácil pro leigo.
Eu reforço a minha posição de que mesmo que a pessoa perca a demanda é importante a pessoa se mexer entende? No mínimo será uma dor de cabeça aos correios, isso pq cada uma individualmente irá propor uma demanda, mas o correio terão de responder a dezenas, centenas de ações!!! Isso pode sim fazer com que o mesmo mude de forma categórica, e pra melhor seus serviços.
Me sinto honrada em poder ajudar. Afinal, o motivo da existencia dos juizados especiais é realmente facilitar o acesso à justiça, que de nada adianta se as pessoas ficam intimidadas pelos orgãos públicos de que não teriam legitimidade para tal.
De novo, Ana Paula, nossa gratidão pela sua participação e pela generositade de ter oferecido seus conhecimentos.